Nas ilhas Britânicas, a Jana ou Sácia latina e a Holda ou Perchta germânica
tomam a forma da rainha dos elfos ou das fadas. Ginzburg anota julgamentos
de mulheres e homens na Escócia do final do século XVI ao XVII que
disseram ter-se encontrado com essa Rainha e seu consorte (ora um belo
homem, ora um cervo – animal também ligado a Diana).
Na peça Sonho de Uma Noite de Verão, Shakespeare dá à Rainha o nome de
Titânia, um nome dado pelo poeta romano Ovídios às filhas de Titãs em geral
e a Selene – uma das formas de Diana – em especial. Já seu contemporâneo,
Edmund Spenser, a chamou de Gloriana no poema The Faerie Queene,
dedicado à rainha Elizabeth I
.
Ao marido de Titânia, Shakespeare deu o nome inglês tradicional de Oberon,
Ao marido de Titânia, Shakespeare deu o nome inglês tradicional de Oberon,
derivado do francês Auberon ou Alberon, que por sua vez vem do alemão
Alberich, “rei dos elfos” – que na Canção dos Nibelungos é o rei dos anões que
guarda o tesouro cobiçado e afinal conquistado por Siegfried. A confusão
entre elfos e anões pode parecer absurda para fãs de O Senhor dos Anéis de
Tolkien e dos jogos de RPG, mas era perfeitamente natural para os povos
nórdicos e germânicos. Seus elfos eram originalmente deuses menores da
natureza e da fertilidade ou espíritos dos mortos. Seu nome – Elf em inglê
s e alemão, Alv (macho) ou Älva (fêmea) em sueco – deriva de uma raiz indo-
européia que significa “alvo, branco”, mas o mais famoso dos autores de
sagas vikings, Snorri Sturluson, garantiu, no século XIII, que há dois tipos de
elfos: os ljósálfar, elfos de luz, que vivem no céu (num lugar chamado
Álfheimr) e os svartálfar (elfos negros) ou dökkálfar (elfos da sombra), que
vivem no subsolo. Estes últimos, segundo ele, são o mesmo que dvergar
(anões, em inglês dwarves). O rei dos “elfos da sombra” é Völundr, deus
ferreiro conhecido pelos saxões como Weyland e protótipo dos anões
artesãos do folclore. Nada a ver com os orcs e uruk-hai de Tolkien, nem com
os drows dos RPGs. Associadas a águas e grutas, confundidas com fadas,
bruxas e anjas, as janas e sácias lembram as ninfas e náiades da mitologia
grega e as rusalkas e vilas das lendas eslavas (chamadas “veelas” em Harry
Potter e o Cálice de Fogo), famosas por atraírem belos jovens para o
afogamento.
Também recordam as “damas do lago” das lendas arturianas. Uma delas,
Viviane, criou sir Lancelot e deu ao rei Artur a famosa espada Excalibur; outra,
chamada Nimue ou Nyneve (quando não a mesma Viviane), tem um caso de
amor com Merlin e aprende sua magia, mas acaba por aprisioná-lo para
sempre numa árvore, rocha ou castelo. A mais famosa, a fada Morgana,
conspira na lenda clássica contra o meio-irmão Artur e acaba por causar sua
perdição. Vale notar que os marinheiros italianos chamam de Fata Morgana
uma miragem comum no estreito de Messina, produto da distorção de
penhascos pela refração do ar, que dá a ilusão de pináculos ou castelos de
altura fantástica. Tanto os nomes de Nimue quanto o de Morgana derivam de
antigas deusas celtas, que provavelmente foram as “rainhas das fadas”
originais. Uma versão dá à primeira “dama do lago” o nome de Argante, de
Ard Righan (Alta Rainha), epíteto de várias deusas celtas. Outra analogia
clara é com as banshees do folclore celta – de bean sidhe, mulheres sidhe.
Sidhe, Sith (alguém mencionou George Lucas?), Shee ou Si, conforme o
dialeto, são os deuses e espíritos da natureza celtas, análogos aos elfos
germânicos e às janas latinas. O nome sidhe, por sinal, referia-se
originalmente às colinas nas quais esses seres – originalmente Tuatha de
Danaan (filhos de Dana, a deusa-mãe irlandesa) – teriam se refugiado após a
invasão da Irlanda pelos mortais. A mais famosa dessas colinas, Newgrange,
é na realidade um grande túmulo pré-histórico, como as “casas das janas” da
Sardenha. Aliás, elfos e elfas “das sombras” germânicos e nórdicos também
vivem em colinas e montes de pedras. Também se encontra, em Portugal e
Galiza, o nome de xaira. Há, perto de Bragança, Portugal, uma localidade
chamada Curriça (estábulo) das Xairas. Talvez uma variante do nome árabe
“mouras encantadas” do folclore português.
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